Sucesso e inevitáveis comparações
Durante a exibição de sua segunda temporada, Ruptura se tornou a série mais assistida do streaming da Apple TV. Por isso, não é nenhum exagero afirmar que a série alcançou um sucesso indiscutível. A obra se encontra tão em alta que muitos estão a chamando de a nova Lost. Para os mais novos, Lost foi a primeira série de mistérios de grande sucesso. Várias eram as teorias debatidas pelos fãs por conta de sua narrativa enigmática, num tempo que a internet não tinha a força que possui hoje. Sendo assim, ainda com um final polêmico a série foi a primeira a conquistar um grande público. De lá pra cá, tiveram inúmeras séries de mesmo gênero, como Westworld, mas que nunca conseguiram alcançar o mesmo impacto de Lost.
Fidelidade naquilo que se propõe
Ruptura conseguiu conquistar uma audiência massiva e apaixonada por um universo autêntico e que é bastante fiel ao que se propõe. Nesse sentido, pode-se definir de forma objetiva que o critério no qual distingue uma obra boa de uma ruim é a execução de sua proposta. Como assim? Todo obra tem seu gênero, que no caso de Ruptura pode ser considerado a ficção científica. Pois bem, a proposta desse gênero é se aprofundar no existencialismo. Em outras palavras, usar a trama para nos faz questionar acerca da nossa psique, do nosso eu, da nossa própria existência. E é justamente aí que Ruptura se destaca.
Além da série ser um labirinto de mistérios e reviravoltas, ela acaba mergulhando de maneira impactante e íntima no nosso eu por meio de sua narrativa, sendo este um dos motivos que a torna especial. Ainda que haja comparações com outras séries, como Black Mirror e Lost, Ruptura consegue alcançar originalidade dentro de seu design artístico e sua narrativa visual. Tanto o visual quanto o design de produção buscam passar um ambiente minimalista, que orbita entre o cinismo e uma vibe claustrofóbica. Tudo isso para gerar no público sentimentos de desconforto carregado de uma imprevisibilidade, visto que os mistérios são elementos que acabam impulsionando a trama.
Quem é você?
Desde seu inicio, Ruptura já começa desenvolver uma carga existencialista na sua narrativa. Não é por acaso, que a primeira fala da série é o seguinte questionamento – Quem é você? Parece uma pergunta boba ou até genérica, mas ela vai se impregnar no inconsciente do espectador enquanto desfruta da obra, servindo como fundamento de todo desenvolvimento da série. Nesse sentido, não se pode deixar de realizar uma análise mais minuciosa da nomenclatura muito comumente utilizada no universo da série, que é a figura do interno e do externo. Sendo o primeiro aqueles que trabalham na Lumon, enquanto que o segundo são os que não possuem as memórias do seu interno, vivendo fora do ambiente de trabalho. Nota-se que a primeira temporada buscou apresentar e desenvolver estas duas figuras chaves, ao passo que a segunda vai aprofunda-las a ponto de fazerem elas até mesmo entrarem em conflito.
Dicotomia entre externo e interno
Cabe destacar que o externo não compartilha a consciência, nem mesmo suas memórias com seu interno. Sendo justamente essa dicotomia dentro da pessoa no qual passou pelo processo de Ruptura que a série vai brincar, fazendo disso seu parque de diversões. Até mesmo porque ao observar o interno e o externo de um personagem, concluí-se que não se tratam da mesma pessoa, visto que suas personalidades são completamente diferentes. Essas diferenças são estabelecidas muito por conta do ambiente que estão inseridos e das memórias que carregam consigo criadas por suas experiências vividas.
Curioso notar que até o tratamento que um concede ao outro pode ser desigual, chegando ao ponto de um não considerar o outro nem sequer ser uma pessoa. Isso ocorreu com a personagem da Helly, quando sua externa, Helena Eagan, disse que ela não poderia sair da Lumon e não a considerava uma pessoa. Analisando essa personagem percebemos o quanto ela são distintas nas maneiras de ser comportarem. Enquanto a externa da Helly é toda cometida, discreta e manipuladora, sua interna é totalmente indiscreta, impulsiva e sincera nas suas ações. Outro personagem que percebemos diferenças é o Mark e seu externo. Nota-se que na empresa da Lumon, Mark é simpático e passa uma vibe alto astral, ao passo que fora possui uma melancolia e antipatia, muito por conta do luto que vive por ter perdido a esposa.
As diferenças vistas nos internos e externos servem para nos mostrar que quem define nosso eu são as nossas memórias e ambientes que ocupamos. Sendo assim, são nossas experiências que moldam nosso comportamento e personalidade, explicando o fato do interno e externo de uma pessoa serem seres tão distintos, embora façam parte do meu eu.